Ensino de sementes no Brasil é referência, mas precisa de constantes investimentos
05/02/2017

Reconhecido internacionalmente como um grande polo de ensino de sementes, o Brasil é figura importante e de destaque em grandes eventos da área e nas publicações técnico-científicas produzidas em todo o mundo. Atualmente, segundo o professor da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP), autor de importantes livros da área, e titular do Conselho Fiscal da ABRATES, Dr. Júlio Marcos Filho, o País é líder na produção de conhecimento sobre sementes, fato comprovado há mais de 10 anos em congressos promovidos pela International Seed Testing Association (ISTA), a mais importante instituição do setor no âmbito científico.
Silvio Moure Cicero 1O também doutor e professor da ESALQ/USP Silvio Moure Cícero reitera a informação e completa: “É importante destacar que existem no Brasil cerca de 5.500 engenheiros agrônomos que atuam nas mais diversas áreas que compõem o segmento de sementes e que existem no Brasil cerca de 600 empresas produtoras de sementes”.
Não por acaso, o Brasil é, também, referência em produtividade. É o que comprova um estudo realizado pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em conjunto com a agência das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), divulgado em julho de 2015. O documento afirma que, se forem considerados os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e os membros da OCDE, que inclui principalmente economias desenvolvidas, o Brasil "é o país que mais melhorou sua produtividade total de fatores (PTF) agrícolas", alcançando um aumento de mais de 4% em sua produtividade desde 2000.
Dentre outros fatores, o recorrente estudo sobre sementes e o melhoramento genético são responsáveis por estes bons resultados, assim como a constante tomada de consciência do agricultor em relação à importância de sementes puras e vigorosas para a ocorrência de boas lavouras. “A semente constitui o insumo que conduz os avanços da genética para o campo e, também é responsável pelo sucesso do estabelecimento do estande constituído por plântulas vigorosas em campo. Isto constitui a base para a obtenção de alta produtividade em campos de produção de grãos, hortaliças, frutas, forrageiras e essências florestais. Por isso, esse conhecimento não pode faltar na composição de programas de ensino em escolas de agronomia, engenharia florestal e zootecnia”, explica Marcos Filho.
Mas toda essa relevância não surgiu de um dia para o outro. O ensino de sementes no País começou em meados da década de 60, na ESALQ/USP e na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), quando professores que participaram de aperfeiçoamentos na Universidade Estadual do Mississippi, nos Estados Unidos, trouxeram os primeiros programas de graduação e pós-graduação. Segundo o professor Silvio Moure Cícero, o impulso maior ocorreu em 1972, com o lançamento do programa Apoio Governamental para a Implantação do Plano Nacional de Sementes, que iniciou todo o suporte à organização da produção, ao ensino e à pesquisa de sementes no Brasil.

Professor Julio Marcos FilhoDepois disso, de acordo com o professor Marcos Filho, outros cursos, em diferentes instituições de ensino, começaram a ser criados gradativamente. “Hoje, o ensino nessa área está disseminado em todo o território, em universidades estaduais, federais e instituições particulares, além de alguns institutos de pesquisa que oferecem programas ou disciplinas de pós-graduação”, conta. As mais modernas, segundo ele, abordam conhecimentos na área de análise computadorizadas de imagens e de biologia molecular associada à qualidade de sementes. Uma delas, conta Moure Cícero, é a disciplina de “Análise de Imagens de Sementes e Plântulas”, instituída a nível de pós-graduação na ESALQ/USP, em 2014, que trata de assuntos relacionados à utilização de técnicas de análise de imagens como raios X, microtomografia de raios X, ressonância magnética, fluorescência de clorofila, imagens multiespectrais e hiperespectrais e análise computadorizada de plântulas.

É com bons programas e disciplinas cada vez mais modernas, como a citada anteriormente, segundo Marcos Filho, que as instituições brasileiras têm diplomado grandes profissionais. No entanto, para ele, as disciplinas de graduação não podem ser consideradas as únicas fontes de formação profissional. “Cada disciplina geralmente tem carga horária de 60 horas e isto corresponde a dois dias e meio. Em que atividade cada indivíduo pode se tornar competente neste período tão curto? Por isso, para aprimorar sua formação, o estudante deve realizar atividades extracurriculares e o profissional procurar, sempre, realizar atividades que permitam a atualização permanente dos conhecimentos”, recomenda. O que é possível fazer nas próprias universidades, ingressando em cursos de pós-graduação, ou em outras atividades oferecidas pelos diversos institutos de pesquisa situados em diferentes regiões do País, como é o caso da própria ABRATES, que já há alguns anos tomou a iniciativa de promover cursos de atualização de conhecimentos na área.
Todos estes fatores aliados ao esforço empregado desde o início do ensino de sementes no Brasil e à atuação da iniciativa privada neste mercado resultaram na construção de um grande polo, capaz de formar profissionais altamente competentes, eficientes e dedicados.
Apesar disso, de acordo com Marcos Filho, o setor acadêmico lida com uma urgência estrutural. “Professores formadores de opinião estão se aposentando sem reposição. O exemplo mais marcante foi o ocorrido recentemente na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal/UNESP, com a perda não reposta de expoentes. Infelizmente, esse cenário deve se repetir a médio prazo e também pode ser vislumbrado em instituições de pesquisa”, opina. Para ele, a solução é uma só: “Os dirigentes devem voltar a investir pesado para evitar o desmantelamento do ensino e pesquisa em sementes no País”. Moure Cícero concorda e afirma que é necessário tomar medidas não para melhorar, pois o cenário do ensino de sementes, graças a todos os fatores já citados, é bastante positivo, mas para manter tudo aquilo que se conquistou duramente durante estes 50 anos de ensino, estudo e investimento.