Fruto da nova geração, Fernando Henning conta que o interesse pela agronomia surgiu ainda na infância e diz que um de seus principais desafios no cargo é trazer os jovens profissionais para a ABRATES
Fernando Augusto Henning. Formado em engenharia agronômica, mestre e doutor em Ciência e Tecnologia de Sementes e pesquisador da Embrapa Soja. Quem ouve e não vê talvez até imagine um homem de meia idade, de cabelos grisalhos e óculos de grau. Engana-se. Aos 34 anos, Henning é o mais novo membro do corpo diretivo da ABRATES. No cargo de vice-presidente, recém-eleito na última edição do Congresso Brasileiro de Sementes, ele acumula grandes responsabilidades e desafios.
Mas para chegar até esse momento, a trajetória foi grande, começou, despretensiosa, ainda durante a infância. Por uma questão de origem familiar, ele se via bastante ligado ao campo, especialmente por parte do avô, que era um pequeno agricultor, produtor de erva mate. “Nós sempre tivemos um pezinho na roça”, brincou.
Foto: Ascom/ABRATES
Nascido no sul do Paraná, na cidade de Rio Negro, Fernando cresceu em São José, cidade litorânea de Santa Catarina, estado onde graduou-se engenheiro agrônomo, em 2004, na Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), em Lages. Segundo o vice-presidente, ainda nessa época, a ideia de trabalhar com sementes não passava por sua cabeça, mesmo sua relação com a ABRATES sendo mais próxima do que ele imaginava. “Na verdade, o fato de meu tio, Ademir Henning [titular do Conselho Fiscal e ex-presidente da ABRATES] ser ligado à ABRATES me influenciou de alguma forma, principalmente, via conselhos e dicas repassadas.”, explicou.
No entanto, o contato com o mundo das sementes só foi acontecer, de fato, quando Fernando já cursava agronomia. “Foi aí que eu comecei a descobrir as coisas. Entre elas, a ABRATES, a importância da equipe da Embrapa Soja, sua colocação nacional e internacional, essa articulação que essas instituições promoviam na área de sementes. E trabalhar com isso na universidade, na época, era muito fácil, porque nós tínhamos muito acesso. Na época, a gente tinha uma EPAGRI [Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina], que é um órgão de pesquisa estadual de Santa Catarina, ao lado da UDESC, que nos facilitava muito trabalhar com forrageiras e espécies de grande importância para aquela região”, lembrou.
Para Fernando, esse contato foi essencial e fez com que ele pudesse vislumbrar os diversos caminhos que o mercado poderia oferecê-lo futuramente. Entre eles, o da academia, que Henning seguiu já em 2005, com o mestrado em Ciência e Tecnologia de Sementes na Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). “Para quem já tinha estudado a 200 quilômetros de casa, estudar a 800 não fazia diferença. Além disso, hoje eu vejo que vários dos meus co-orientandos da UEL sentem uma dificuldade muito grande no fato de estarem longe da família, amigos, namorada ou esposa. Eu não tinha essa dificuldade, porque na época tanto eu quanto minha esposa - até então, namorada - fomos aceitos para o mestrado na UFPEL. Então foi algo que facilitou muito na nossa decisão”, contou.
Antes disso, no entanto, foi necessária muita reflexão. “A gente estudou muito para saber qual era o tipo da linha de pesquisa, qual a prospecção do profissional que entrava lá? O que acontecia com ele? Se ele se inseria no mercado ou não. Mas sempre com aquela dor no coração, porque era uma época em que o profissional - engenheiro agrônomo - estava sendo muito valorizado no mercado de trabalho. Da minha turma, por exemplo, a maioria saiu empregada. Só eu e mais três colegas seguimos para a pós-graduação”, relembrou. As dúvidas foram muitas, segundo Fernando, mas seu objetivo o fez persistir. “Era uma realização pessoal”, pontuou.
Nessa fase, Henning contou que seu principal desafio foi chegar à UFPEL com um foco bem diferente da linha de pesquisa que a universidade precisava suprir. “Em 2004, no estágio de conclusão de curso, eu trabalhei com a parte de fisiologia e patologia de sementes e, chegando lá, eles disseram que precisavam de pesquisas na área de biotecnologia em sementes. No início foi um estresse, um desgaste muito grande, nós tivemos que ter foco, mas, se eu tivesse que voltar e fazer tudo outra vez, eu faria exatamente assim. Eu costumo dizer que foi o desafio certo na hora certa”, disse.
Ao final do mestrado, em 2007, Henning teve a oportunidade de seguir na academia e formar-se doutor, também em Ciência e Tecnologia de Sementes, na UFPEL.
A lição que ele tira dessas experiências, hoje compartilha com seus co-orientandos. “Eu sempre pergunto a eles como vão as disciplinas e se eles me dizem que está tudo bem, eu digo que eles estão fazendo alguma coisa errada. Porque é esse o momento de eles se desafiarem, enquanto estão na zona de conforto. Afinal, depois que eles saírem dos portões da universidade para o mundo do trabalho, quem vai cobrá-los é o empregador e aí não existem segundas chances nem oportunidades para reavaliar e descobrir onde é que se errou”, aconselhou.
Já no final do doutorado, em 2010, Henning participou de um processo de seleção para uma vaga em uma multinacional da área de sementes e foi contratado. Na época, novos desafios. Entre eles, mudar-se para Palmas, no Tocantins e ficar longe da esposa - já noiva -, que havia passado em um concurso para lecionar na Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Entre Palmas e Santa Maria, mais de 2.700 quilômetros separavam o casal. E foi assim por quase dois anos.
Para Fernando, a experiência foi essencial e transformadora. “Mais uma vez, nessa empresa, o foco do grupo no qual eu fui inserido, não era exatamente o que eu havia estudado no mestrado e no doutorado, então foi extremamente desafiador do ponto de vista técnico e científico. Além disso, eu tive a prova concreta de que o mercado exige de você uma segunda língua. No meu caso, era o inglês. Eu tinha chefes americanos aos quais eu tinha que reportar todo mês e realizar reuniões quase que diariamente”, relembrou. O vice-presidente ainda destacou o fato de ser latino, que segundo ele, exigia uma constante reafirmação de sua capacidade.
Em 2011, quando completaria quase dois anos nessa multinacional, mais uma surpresa e uma nova decisão a ser tomada. Henning estava na lista de espera de um concurso da Embrapa e, finalmente, foi chamado. Para alguns, a escolha poderia ter sido feita sem muita dificuldade. Não para Fernando. “Eu estava muito bem dentro da empresa, em termos de posição, de perspectiva interna. Então, vir para a Embrapa foi uma decisão muito pessoal e o que pesou realmente foi o fato de poder, em uma empresa pública, retornar ao meu País um pouco daquilo que já havia sido investido em mim”, relatou.
A partir daí, desde 2012, trabalhando na Embrapa e morando em Londrina, o contato com a ABRATES começou a ficar mais estreito. Tão estreito a ponto de acompanhar a associação de perto e chegar ao cargo de vice-presidente, na mais recente troca de corpo diretivo, durante o 19º Congresso Brasileiro de Sementes, em setembro de 2015.
Essa troca, segundo Fernando, foi acompanhada de uma preocupação muito intensa - especialmente dos colegas de Embrapa Soja, Francisco Krzyzanowski (presidente da ABRATES), José de Barros França Neto (diretor-financeiro e ex-presidente) e Ademir Henning (titular do Conselho Fiscal e ex-presidente) - em relação à renovação dos representantes da associação. “Antes dessa última mudança, eles se perguntavam ‘qual é o futuro da ABRATES? Onde ela vai parar?’. É como se fosse a menina dos olhos deles. Por tanto tempo eles ajudaram, cuidaram e agora ela está crescendo, ganhando reconhecimento nacional e internacional”, comentou, referindo-se ao recente recebimento do título de Entidade de Utilidade Pública do Estado do Paraná, recebido pela associação no último dia 5.
Segundo Fernando, em um primeiro momento, eles tentaram ver com outras pessoas, conhecidos da área de sementes, se elas tinham interesse em tocar a associação nessa nova etapa. A tentativa esbarrou em algumas negativas. “Boa parte das pessoas que estão inseridas no mundo das sementes já está com uma idade avançada e não está disposta a assumir mais um desafio como esse. Então, a ideia do Francisco veio para corresponder a essa demanda: ele assumiria mais uma vez e eu entraria nessa gestão já como vice-presidente para acompanhar os trabalhos que eles vêm desenvolvendo e, para mais à frente, tentarmos articular uma chapa com pessoas mais novas, para dar continuidade a isso”, explicou.
Entre os desafios que a posição implica está a diferença de idade, que segundo Fernando, em alguns momentos é bastante positiva, pois promove uma troca muito interessante de pontos de vista e em outros é desafiadora, justamente por confrontar opiniões diferentes. Mas no final, ele garante: “sempre tomamos a decisão que acreditamos ser a melhor para a ABRATES”.
Além disso, Fernando sente a grande responsabilidade de representar a classe de jovens profissionais e tentar trazê-los para a ABRATES. “Não é uma tarefa fácil, porque não há uma constante reciclagem de profissionais, até por conta do momento pelo qual o País passa, os concursos não estão abrindo”, comentou.
Outro desafio que Henning enfrenta junto à nova diretoria da ABRATES é a organização do próximo Congresso Brasileiro de Sementes, que será realizado em 2017, já em sua vigésima edição. “A ABRATES sempre contou com o apoio e parceria de seus contatos nas diversas posições da cadeia brasileira de sementes. Hoje, muitos deles estão de saída, dando lugar a outros profissionais, que agora formam uma conjuntura totalmente nova e diferente. Então, ao mesmo tempo em que nós precisamos do conhecimento dos profissionais mais experientes, nós também precisamos dos novos para vislumbrar o futuro. E hoje é isso que a ABRATES se propõe a fazer: unir o melhor das duas frentes”, explicou.
Tudo isso com um objetivo principal: dar continuidade ao trabalho já tão bem iniciado e tocado por todos os outros profissionais que já passaram pela diretoria da ABRATES; e vários outros objetivos práticos e pontuais, como: manter e expandir a colocação do Journal of Seed Science - publicação científica oficial da associação - tanto nacional quanto internacionalmente; manter a realização e representatividade do Congresso Brasileiro de Sementes - o principal evento do segmento no Brasil -, que, segundo Henning, é uma excelente oportunidade para qualquer profissional da área conhecer as principais tecnologias e avanços do setor, os principais desafios, criar e cultivar uma rede de relacionamentos ampla e muito importante em tempos de mercado de trabalho cada vez mais competitivo; continuar e expandir a realização das diversas ações com cunho capacitador que a ABRATES vem realizando, como os diversos cursos e treinamentos; dar continuidade à principal bandeira defendida pela ABRATES, em relação à necessidade de sementes de qualidade e alto vigor para a ocorrência de uma lavoura bem sucedida e uniforme e etc.
E para que todos esses objetivos sejam atingidos da melhor forma possível, o vice-presidente declara: “nós precisamos da colaboração e do apoio de todos os representantes da cadeia brasileira de sementes”. Segundo Henning, é importante ter opiniões de fora do universo acadêmico para que se possa corresponder às demandas de todo o segmento sementeiro - em relação aos órgãos públicos e discussões legislativas, apresentação de conteúdos mais práticos, que saiam dos limites da teoria, abordagem de diferentes visões do setor sementeiro, não só em relação às grandes culturas, mas também em relação ao ramo das hortaliças, forrageiras, florestais, etc.
Para isso, Fernando afirma que a associação abre seus canais de comunicação e espera de seus sócios e até mesmo não sócios que acompanhem a ABRATES, sugestões de notícias, críticas e envio de artigos, para que seja possível mantê-los abastecidos dos mais diversos assuntos que possam interessar a todos os envolvidos na cadeia de sementes e para continuar incentivando e impulsionando a produção brasileira de conteúdo científico em sementes.
Quem quiser colaborar, pode entrar em contato com a ABRATES por meio da própria fanpage no Facebook, do formulário de contato disponível no site ou por meio do e-mail contato@abrates.org.br.
Sementes: desafios e tendência para o futuro
Para Fernando, o segmento sementeiro conquistou um grande espaço para que se possa discutir a questão da qualidade das sementes, no entanto, os desafios ainda são grandes. “A questão da pirataria de sementes de soja, por exemplo, é algo que tem estado em evidência. Devido a própria maneira de multiplicação da espécie, o agricultor tem como salvar sua sementes ou adquirir no mercado negro sementes não legais. Normalmente, se faz isso a intenção de economizar, mas existem alguns estudos, pontuais, que comprovam que isso não acontece. Pelo contrário, o agricultor acaba perdendo no produto final, não só em termos de produtividade, mas também de qualidade”, declara.
É aí que, segundo Fernando, surge uma das principais tendências que já se pode observar no segmento sementeiro: a conscientização, cada vez maior, dos envolvidos na cadeia produtiva para a necessidade de um produto de qualidade e de procedência reconhecida. Segundo o engenheiro agrônomo, uma das coisas que suscitam essa tendência é a crescente exigência do próprio consumidor, que vem se preocupando intensamente com a origem dos alimentos que consome. “Se a semente é o insumo primário de qualquer produção, seja de grãos, carne, ração, etc., essa mudança de hábitos do consumidor vai exigir um comprometimento cada vez maior dos envolvidos na produção de sementes no Brasil”, declarou.
Outro ponto que o vice-presidente citou foram os constantes investimentos das empresas envolvidas no setor tanto em tecnologia e maquinário quanto em relação à capacitação e valorização de seus profissionais. “Não adianta, por exemplo, eu comprar uma colheitadeira de dois milhões de reais e pagar um salário mínimo para operador, porque sem conhecimento ou recebendo pouco para isso, ele vai colher sem incentivo ou do jeito que ele acha que é certo”, exemplificou.
Mensagem aos estudantes
Para encerrar, o vice-presidente enviou uma mensagem aos estudantes que acompanham a ABRATES. “Nós gostaríamos de estimulá-los a investirem um pouco e se tornarem sócios e justamente por isso, mantemos um valor especial, mais em conta. Associar-se é um investimento que tem muito a contribuir, já que vocês poderão receber as revistas, ter acesso ao arquivo da ABRATES, que é muito rico e ganhar descontos nos cursos e eventos promovidos pela associação”, finalizou.
Para associar-se, basta acessar este link e seguir os passos indicados.
Fotos: Ascom/ABRATES